Angola produziu 1,356 milhões de barris de petróleo por dia em Outubro, menos 43.000 face a Setembro, segundo o relatório mensal da Organização de Países Exportadores de Petróleo (OPEP) hoje divulgado. E, por cá, falar de petróleo é falar de quem está no poder há 44 anos – o MPLA.
Os valores publicados, com base em dados de fontes secundárias, registam uma quebra da produção, depois de uma revisão em baixa dos valores de Setembro, que passaram de 1,411 para 1,399 milhões de barris por dia.
Angola manteve a posição de segundo maior produtor africano de crude na OPEP, atrás da Nigéria que viu a sua produção diária baixar para 1,811 milhões de barris por dia, uma quebra de 37.000 barris face aos 1,848 milhões de barris de Setembro (valor revisto em baixa, face ao valor do relatório anterior, que apontava para 1,859 milhões).
Durante praticamente todo o ano de 2016 e até maio de 2017, Angola liderou a produção de petróleo em África, posição que perdeu desde então para a Nigéria. A produção na Nigéria foi condicionada, entre 2015 e 2016, por ataques terroristas, grupos armados e instabilidade política interna.
O mais recente relatório da OPEP refere também que, em termos de “comunicações directas” à organização, Angola terá produzido 1,391 milhões de barris por dia em Outubro, mais 22.000 barris por dia que em Setembro.
Os números obtidos através de “comunicações directas” contrariam assim a quebra que consta nos números obtidos pela OPEP junto de fontes secundárias. Já os dados de fontes oficiais nigerianas apontam uma quebra de 16.000 barris por dia, um valor que coloca a produção diária num total de 1,78 milhões de barris.
A OPEP acertou, em Dezembro de 2018, em conjunto com outros produtores que não integram a organização, o corte na produção de petróleo. A OPEP e os dez aliados, que representam metade da produção mundial de petróleo, decidiram em Dezembro cortar a produção em 1,2 milhões de barris por dia e a estratégia funcionou, já que o preço do barril subiu cerca de 30% no primeiro trimestre, antes de estabilizar. No início de Julho, estes aliados aderiram ao prolongamento do corte da produção até Março de 2020.
País rico… para alguns
Um político corrupto (coisa que, como se sabe, não existe em Angola) causa mais estragos para um povo do que uma bomba atómica. As suas actividades nefastas são mais silenciosas, não podem ser vistas a olho nu muitas vezes, mas os danos são mais severos no longo prazo.
Não é uma mera metáfora, basta olhar o caso do Japão que sofreu com 2 bombas atómicas na primeira metade do século XX, mas que em poucos anos conseguiu tornar-se e manter-se como um país desenvolvido e uma das principais potências económicas com alto nível de educação e desenvolvimento tecnológico.
Agora olhemos os países de África. Muitos deles possuem regiões que parecem viver ainda no século XIX. Esses países sofrem com as bombas atómicas diariamente e elas têm nome: corrupção. E Angola parece ser o país mais bombardeado do mundo actualmente e essas bombas têm um combustível que as move: o petróleo.
Praticamente toda a receita de Angola advém das actividades petrolíferas e todos sabem que a Sonangol foi e é sinónimo de MPLA, sendo igualmente fonte de diversos esquemas de corrupção para financiar toda a alta cúpula política e económica do país do MPLA e que não está nem um pouco preocupada com o bem-estar do povo angolano.
Mesmo com a guerra civil que durou décadas e ceifou a vida de milhares de cidadãos, se Angola tivesse uma sólida democracia com políticos realmente comprometidos com o desenvolvimento do país, a situação hoje seria bem diferente. Dezassete anos após o fim a guerra civil, o país ainda se encontra com índices alarmantes de pobreza, desnutrição, fome, mortalidade infantil e analfabetismo. Em 17 anos muita coisa já era para ter mudado na prática se o dinheiro público não fosse desviado para alimentar ainda mais a riqueza de meia dúzia de pessoas.
A falta da democracia verdadeira somada ao frágil sistema económico de Angola provoca efeitos muito negativos no país. Não dá para chamar de democracia um país que teve um presidente 38 anos seguidos, sem nunca ter sido nominalmente eleito, e que tem no Poder o mesmo partido há 44 anos.
A isso chama-se ditadura, uma ditadura que eles insistem ter traços de democracia, mas que é uma ditadura mesmo assim. E também não dá para dizer que Angola tem uma sólida economia, quando o país depende em 97% do petróleo para gerar recursos financeiros, mas a indústria petrolífera só emprega cerca de 0,5% da população. A corrupção é quem faz a ponte entre esses dois elos: indústria petrolífera alimentando a desigualdade no país, beneficiando somente a elite política angolana, toda do MPLA. Cada recurso que deveria ser usado para a construção de escolas, hospitais e obras de infra-estrutura, mas que são desviados para os bolsos dos políticos e empresários, é uma bomba atómica.
A revelação de milhões de documentos provando uma teia de corrupção e lavagem de dinheiro a nível global chocou o mundo. O alto esquema de lavagem de dinheiro ocasionando o enriquecimento ilícito de vários políticos e empresários por meio de ramos offshores (como a indústria petrolífera) só mostrou o quanto os bilionários deste planeta são gananciosos e fazem qualquer coisa para burlar a lei.
“Panamá Papers”… Luanda
O escândalo que ficou conhecido como “Panamá Papers”, pois teve como peça-chave a empresa panamiana, Mossack Fonseca, teve a sua investigação conduzida ao longo de um ano pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (International Consortium of Investigative Journalists, ICIJ), pelo jornal alemão “Süddeutsche Zeitung” e por mais de uma centena de outros órgãos de comunicação social.
Dentre os nomes a serem divulgados de presidentes e ministros nas primeiras divulgações da investigação aparece somente um político dos países africanos de língua portuguesa. Alguém adivinha quem é? Se pensou em José Maria Botelho de Vasconcelos, ministro do Petróleo de Angola, acertou. E ele não foi apenas meramente citado, na investigação o “rei do petróleo angolano” é destacado como um dos principais agentes no esquema de corrupção pelo cargo que ocupava e pele sua vasta rede de influência no mundo petrolífero.
O facto é importante porque legitima o que vários jornalistas e activistas de Angola dizem há anos: o governo do MPLA, comandado por José Eduardo dos Santos, foi altamente corrupto e utiliza a cadeia do petróleo para drenar recursos em benefício próprio. As investigações no país (para as quais o Folha 8 deu um contributo decisivo), foram catalogadas pelo governo como intrigas da oposição ou ilegítimas, mas uma investigação como a do “Panamá Papers”, revelando ao mundo o que verdadeiramente ocorre em Angola, corroborou maciçamente com o que os angolanos e observadores estrangeiros têm afirmando ao longo dos anos: o petróleo do país deixou de financiar a guerra civil para enriquecer uma nova elite corrupta.
Nas investigações divulgadas há um claro indício de lavagem de dinheiro, onde milhões e milhões de dólares foram investidos no Banco Kwanza sem praticamente nenhum sistema de transparência ou auditoria, e essas quantias foram repassadas a destinatários até então desconhecidos.
Até quando essa situação vai permanecer? É uma pergunta de extrema importância que os cidadãos angolanos devem ter em mente, pois as bombas atómicas vão continuar a cair até que algo seja feito. O fortalecimento das instituições públicas e dos preceitos da democracia é um passo importante. Já que a elite político e económica de Angola (que continua a ser gerada apenas pelo MPLA) não se preocupa com o povo, parece que vamos ter um longo caminho até que a situação acabe.
Folha 8 com Lusa